A historiadora e poeta angolana Ana Paula Tavares venceu o maior e mais prestigiado prémio literário para a língua portuguesa.
O júri decidiu atribuir o galardão, no valor de 100 mil euros, à autora de uma vasta obra literária em prosa e poesia e de textos científicos, “distinguindo a sua fecunda e coerente trajetória de criação estética e, em especial o seu resgate de dignidade da Poesia”. Como ainda adianta o comunicado da Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas (DGLAB), “o júri sublinhou que, com a dicção do seu lirismo sem concessões evasivas e com os livres compromissos da produção em crónica e em ficção narrativa, a obra de Ana Paula Tavares ganha também relevante dimensão antropológica em perspetiva histórica”.
Somos cada vez mais como as buganvílias, a florir em sangue no meio da tempestade.
Ana Paula Tavares tem sido presença nalguns dos programas de Luís Caetano na Antena 2. Na noite do anúncio do Prémio Camões, e recuperando a conversa tida na Feira do Livro de 2023, a propósito do livro O Sangue da Buganvília – textos que trazem a força da metáfora da árvore a que se refere o título – podemos escutar esta autora que nos convida a aprender com os ciclos da natureza e a ouvir poesia, quando “o mundo está a mudar mais depressa do que aquilo que somos capazes de acompanhar. Somos cada vez mais como as buganvílias, a florir em sangue no meio da tempestade.”
Ana Paula Tavares nasceu em em 1952, no Lubango, Huíla, e é licenciada em História e Mestre em Literaturas Africanas de Língua Portuguesa pela Universidade de Lisboa. Entre 1983 e 1985 coordenou o Gabinete de Investigação do Centro Nacional de Documentação Histórica em Luanda e de 1988 a 1990 foi membro do júri do Prémio Nacional de Literatura de Angola. A autora faz parte da chamada “geração literária de 80”, focando-se sobretudo na condição da mulher na sociedade angolana. É colaboradora da RDP-África.
Entre os seus livros de poesia destacam-se Ritos de Passagem (1985), O Lago da Lua (1999) e Dizes-me Coisas Amargas Como os Frutos (2001).
Tanto a prosa como a poesia de Ana Paula Tavares estão presentes em várias antologias publicadas em países como Portugal, Brasil, França, Alemanha, Espanha e Suécia.
Em 2004, Ana Paula Tavares ganhou o Prémio Mário António de Poesia atribuído pela Fundação Calouste Gulbenkian com o livro Dizes-me coisas amargas como os frutos, e três depois recebeu o Prémio Nacional de Cultura e Artes de Angola (categoria literatura), pelo livro Manual para amantes desesperados.
Alguns poemas de Ana Paula Tavares, ditos pela própria:
[perguntas-me do silêncio..]
os novos cadernos de fabro
[de que cor era o meu cinto de missangas…]
O Premio Camões é um prémio literário instituído pelos Governos de Portugal e do Brasil em 1988 com vista a estreitar os laços culturais entre os vários países lusófonos e enriquecer o património literário e cultural da Língua Portuguesa.
É atribuído a autores pelo conjunto da obra, numa iniciativa patrocinada pelo Ministério da Cultura português, através da Direção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas (DGLAB), com a colaboração do Gabinete de Estratégia, Planeamento e Avaliação Culturais, e pela parte brasileira pela Fundação Biblioteca Nacional (FBN) do Brasil.
Dos 35 autores já laureados, Ana Paula Tavares é a nona mulher a vencer o galardão, depois das brasileiras Rachel Queiroz (1993), Lygia Fagundes Telles (2005) e Adélia Prado (2024), das portuguesas Sophia de Mello Breyner Andresen (1999), Maria Velho da Costa (2002), Agustina Bessa-Luís (2004) e Hélia Correia (2015) e da moçambicana Paulina Chiziane (2021).
É também a segunda personalidade angolana a vencer o Prémio Camões, depois de Pepetela (1997) e do lusoangolano José Luandino Vieira (2006), mas este último recusou o prémio, e dos autores africanos de língua portuguesa, é a sétima a ser galardoada.
Fotos Jorge Carmona / Antena 2