EstreiaTeatro de Ópera Comica de Londres, no dia 23 de Abril de 1881
AntecedentesSir. Arthur Sullivan, juntamente com W. S. Gilbert, inventou o conceito de "Savoy Opera" e os dois tornaram-se inseparáveis. As operetas de Gilbert e Sullivan parodiavam as convenções operáticas e ridicularizavam a aparatosa burocracia britânica (japonizada em Mikado). Mas Sullivan queria ser reconhecido como compositor sério e escreveu também muitas obras instrumentais, corais e até uma ópera.
Arthur Sullivan era filho de um maestro de banda irlandês e de uma italiana. Corista inflamado na Chapel Royal, publicou a sua primeira composição com 13 anos de idade. Após os estudos em Londres na Royal Academy of Music e depois no Conservatório de Leipzig, compôs cantatas e uma sinfonia antes de escrever a sua primeira opereta cómica, Cox and Box. Em 1871 conheceu o dramaturgo W. S. Gilbert e começaram uma colaboração que durou até terem uma discussão absurda sobre um novo tapete do Teatro Savoy em 1889. Só se reuniram para escrever as duas ultimas operetas. Entretanto Sullivan escreveu a sua única ópera séria, Ivanhoe, na qual esperava confirmar a sua reputação. No entanto, manteve-se firmemente associado às operetas cómicas feitas em parceria com Gilbert.
Patience é a primeira ópera que verdadeiramente se encaixa no chamado grupo de operetas do Savoy – um nome colectivo que é dado a todas as operetas escritas em colaboração com Gilbert para o Teatro Savoy, em Londres, mandado construir pelo empresário Richard D’Oyly Carte para que a dupla Gilbert e Sullivan aí pudesse apresentar as suas comédias musicais. Apesar de Patience ser a sexta colaboração com Gilbert, esta foi a primeira a ser escrita e montada a pensar já no palco do Savoy.
Depois de uma primeira apresentação no Teatro de Ópera Comica de Londres, no dia 23 de Abril de 1881, Patience chegava ao Savoy no dia 10 de Outubro do mesmo ano. Nessa noite Sullivan apresentava ao público londrino cenários e figurinos totalmente novos, bem como um coro reforçado. Contudo, essa noite ficaria marcada pela novidade da iluminação da plateia com luz eléctrica. O espanto perante tal claridade fez com que a própria plateia rivalizasse em espectáculo com o que se passava no palco, dado o elevado número de figuras públicas presentes nessa noite e que pela primeira vez eram bem perceptíveis. Entre elas, Óscar Wilde foi o que mais se destacou, de tal maneira que se chegou a comentar que o libreto estava impregnado de inspiração Wildiana – Patience é uma sátira à Estética, e aos poetas estéticos que, no século XIX, estiveram muito em voga, liderados pelo então jovem Oscar Wilde.
O termo Arte Estética aparece pela primeira vez no séc. XIX, para designar algo de novo: não a mera e atemporal atracção pelo Belo, mas uma nova convicção acerca da importância da beleza e da arte, em confronto com outros valores, designadamente os que se associam à esfera ético-moral. Nesta acepção, o Esteticismo é uma atitude emergente em França e em Inglaterra a partir da década de 1860, representando a configuração de uma mundividência centralizada na sobrevalorização da categoria do Belo.
A primeira manifestação da tendência esteticista ocorrera já no domínio da própria arte, traduzindo-se na reivindicação da sua autonomia face a critérios valorativos de carácter exógeno (arte pela arte). Logo, porém, a atitude esteticista alastra-se pela visão que o homem tem de si próprio enquanto produtor de valores pelos quais rege a sua conduta. Não apenas na arte mas também na própria vida, o sentimento do Belo passa a ser, para alguns, o valor mais elevado, já que permite viver acima da vulgaridade do homem comum.
É como poeta e professor de Estética que Wilde começa a angariar notoriedade na sociedade londrina depois de terminar os estudos em Oxford, onde foi discípulo de Ruskin e de Pater. nesta primeira fase, é como símbolo vivo do Esteticismo, como cultor do artificialismo e do dandismo que ele sai do anonimato, passando a figurar como alvo preferido das sátiras espalhadas pelos jornais e revistas da época. As suas posses e vestuário são caricaturadas por George du Maurier na revista Puch, e Gilbert e Sullivan ao elaborarem a ópera satírica Patience (1881) tomam-no como principal fonte de inspiração para criarem a figura de Bunthorne, o Esteta. Os Estetas em geral e Oscar Wilde em particular, ansiosos por transcender a cultura e a moral burguesas, encontram resposta para os seus anseios numa certa forma de elitismo urbano de tendências pró-aristocráticas, traduzido numa comunhão de gosto pelo artifical e pelo exótico. O fascínio que a cultura francesa neles desperta aponta, por outro lado, para a influência determinante que autores como Baudelaire e Huysmans exerceram na configuração do Esteticismo.
Resumo
I Acto
As Donzelas estetas (incluindo Lady Jane, Lady Angela, Lady Ella e Lady Saphir), aguardam ansiosamente a decisão do poeta esteta Reginald Bunthorne sobre com quem casar. Elas estão absolutamente encantadas com a sua poesia e abandonaram tudo para se entrincheirarem no castelo do poeta. Contudo Bunthorne só tem olhos para Patience, a leiteira da aldeia, que nada sabe de poesia, nem sequer se mostra interessada nele. As Donzelas desconfiam de que a leiteira nem sequer sabe o que é o amor e lamentam a sua condição. Então Patience avisa-as de que os seus noivos formais, cavaleiros do 35º regimento de cavalaria, se encontram na vila. Nesse momento chega Bunthorne que não liga nenhuma às donzelas. A frustração destas aumenta ao aperceberem-se do efeito que a leiteira tem sobre ele.
A sós, o poeta confessa: ele é apenas um poeta esteta, motivado por um amor altruísta e puro. Resolve então falar com Patience sobre o seu esteticismo mas, em vez de a cativar, ela fica aborrecida. A sós, Patience é interpelada por Lady Angela que lhe pergunta sobre o que a está a incomodar. Patience responde com duas perguntas: que raio é que é esta coisa do amor que deixa as pessoas tão perturbadas; e… como é que sabemos que não estamos loucos?… Lady Angela explica que o amor é uma emoção altruísta. Convencida de que esta emoção nebulosa e altruísta não é para ela, Patience acaba por confidenciar que quando era ainda uma rapariga, se apaixonou por um rapaz… "mas isso não deve contar, pois não?"
Eis que Patience encontra um outro poeta, de nome Archibald Grosvenor. Ela sente-se atraída pelo recém-chegado e, palavra puxa palavra, acaba por descobrir que ele é o tal rapazinho por quem ela tivera uma paixoneta quando era nova. O sentimento de Patience por Archibald vai crescendo a ponto de ela ver nele um ser perfeito. Então Patience depara com um obstáculo: se o amor deve ser altruísta, seria totalmente egoísta da sua parte amar tal homem, tal perfeição. Devem afastar-se.
Entretanto, Bunthorne perde totalmente a esperança em conquistar Patience e decide oferecer-se como prémio matrimonial. As Donzelas rejubilam com a possibilidade de ganhar Bunthorne. Mas, mais uma vez Patience aparece e estraga os planos às jovens quando anuncia o seu interesse em casar com Bunthorne, dado que casar-se com alguém com tantos defeitos deve ser verdadeiramente altruísta. As donzelas desistem de Bunthorne e apontam baterias para o recém-chegado Grosvenor. Ironicamente, Bunthorne, habituado a ser o centro das atenções, não consegue conter os ciúmes com essa mudança súbita nas intenções das donzelas.
II Acto
Lady Jane lamenta a perda das suas qualidades físicas. Apenas ela se manteve fiel a Bunthorne, mas ele está apático. A relação de Bunthorne com Patience também não é propriamente feliz. Continua sem tolerar a admiração feminina de que Archibald é alvo e de nada lhe serve o consolo da fidelidade de Patience.
Por sua vez, os jovens cavaleiros presentes na aldeia, decidem que a maneira de recuperarem as suas noivas é tornarem-se eles próprios, poetas estetas. Quando o Duque, o Coronel e o Major aparecem vestidos como verdadeiros estetas, com gestos afectados, atitudes e palavras cuidadosamente pensadas, ganham imediatamente a admiração de Angela e Saphir, muito embora ainda não se saiba quem vai casar com quem.
Entretanto Bunthorne, encorajado por Jane, decide confrontar Archibald Grosvenor. Bunthorne exige que o seu rival deixe de lado a poesia esteta e passe a ser um jovem normal, ao que Grosvenor acede, dizendo que há muito que aguardava por um pretexto para o fazer – "é que isto do estetismo dá muito trabalho!". Com esta inesperada vitória, Bunthorne decide pôr de lado o mau feitio para voltar a ser popular entre as jovens. A princípio, Patience está encantada com a mudança, no entanto, quando ele lhe diz que aspira à perfeição de Grosvenor, ela considera que está perante uma ameaça ao seu amor altruísta.
Patience e Bunthorne são interrompidos pela chegada das Donzelas que vêm para comunicar que abandonaram o estetismo, seguindo o exemplo de Grosvenor. Patience fica chocada com a mudança drástica de Grosvenor, mas, depois de pensar um pouco, apercebe-se que o obstáculo que a impedia de ser feliz com ele fora derrubado: Grosvenor deixara de ser perfeito.
Jane é agora a única a manter-se fiel a Bunthorne. Quando o poeta finalmente se resigna com isto, o Duque anuncia que um homem rico e de estatuto como ele, deve desposar a jovem com menor probabilidade de ser escolhida: isto é, Jane! Ela aceita a proposta e o poeta é obrigado a aceitar que afinal nenhuma das jovens será a noiva de Bunthonre.