23 Dezembro | 16h00
29 Dezembro | 12h00 (repetição)
um programa de João Chambers
500 anos do “Auto do Purgatório” de Gil Vicente
Comemoram-se os 500 anos sobre a estreia de uma notável criação de Mestre Gil, representada, perante a Rainha D. Leonor, nas matinas do dia de Natal e comum e erroneamente designada por “Auto da Barca do Purgatório”.
Indicada, na Taboada, ou índice, da “Complilaçam de todalas obras de Gil Vicente”, como “Barca Segunda”, o título parece ter sido contaminado pelos da “Barca do Inferno” e da “Barca da Glória”, onde, decidida de acordo com a conduta levada em vida, surge esse meio de transporte a conduzir os defuntos à última morada.
Na verdade, não se assiste aqui a uma viagem para o Purgatório, tão-pouco num transporte com esse nome, porquanto, mais do que um espaço, constitui a alegoria de um estado ou de um tempo de espera e de purificação da alma antes do prometido ingresso no Paraíso.
Ana Margarida Flor/João Chambers
Ana Margarida Flor/João Chambers
Estátua de Gil Vicente (1842)
Francisco de Assis Rodrigues
Teatro Nacional D. Maria II, Lisboa
A 25 de Dezembro de 1518 estreava-se a segunda peça, e primeira levada à cena, da Trilogia das barcas, de Gil Vicente (c. 1465 — c. 1536) : Auto da Barca do Purgatório. No ano anterior, escrevera a primeira, o Auto da Barca do Inferno que só seria representada anos depois; no ano seguinte é escrito e representado o Auto da Barca da Glória.
As peças desta Trilogia apresentam uma estrutura e assunto semelhantes: depois da morte, as almas abandonam os corpos e chegam a um rio, onde se encontram dois barcos. Um deles tem como destino o Paraíso e tem como comandante um Anjo; a outra barca dirige-se para o Inferno e para o Purgatório, e é liderada pelo Diabo.
Nelas, as personagens dialogam com o Anjo e com o Diabo até ser dado a conhecer o seu destino: Inferno, o Purgatório ou o Céu. E este destino depende dos atos cometidos em vida na Terra, vida essa que nos vai sendo dada a conhecer através dos discursos das personagens. O Diabo e o Anjo têm o papel de acusadores e a personagem de réu e de advogado de defesa simultaneamente.
No Auto do Purgatório, Gil Vicente procede a uma simplificação da estrutura, recorrendo apenas a seis personagens e a uma maior uniformação social – todas de condição humilde. No Auto da Barca do Inferno são quinze as personagens e de diferentes estratos sociais; já no Auto da Barca da Glória são oito personagens, todas de alto estrato social.
No Auto do Purgatório, Gil Vicente procede a uma simplificação da estrutura, recorrendo apenas a seis personagens e a uma maior uniformação social – todas de condição humilde. No Auto da Barca do Inferno são quinze as personagens e de diferentes estratos sociais; já no Auto da Barca da Glória são oito personagens, todas de alto estrato social.
Principalmente nas duas primeiras Barcas, a intenção de crítica social é nítida, através de um retrato contundente da sociedade do século XVI.
Custódia de Belém, 1506
Autoria atribuida ao ourives e dramaturgo Gil Vicente
Museu Nacional de Arte Antiga
Música Aeterna assinala esta importante efeméride da cultura portuguesa, dedicando um programa aos 500 anos da estreia do “Auto do Purgatório” de Gil Vicente, escutando-se também música, quase toda de compositores coevos, como Miguel da Fonseca, Fernão Gomes Correia, Juan Urrede, Pedro de Escobar, Heinrich Ignaz Franz von Biber, Manuel da Fonseca, Juan de Anchieta, Thomas Ashwell e Damião de Góis, e ainda de autoria anónima.