Centenário Maria Callas na Antena 2
No dia 2 de Dezembro cumpre-se 100 anos do nascimento da mais famosa cantora de todos os tempos, a soprano greco-americana Maria Callas (Nova Iorque, 2 de dezembro de 1923 – Paris, 16 de setembro de 1977).
Com uma voz de considerável alcance, Callas encantou em todos os palcos que pisou. Cantora de raros dotes vocais e interpretativos, revolucionou a ópera, trazendo-a novamente às origens. Para Maria Callas, a expressão vocal era primordial, em detrimento dos exageros vocais injustificados – tudo na ópera tem que fazer sentido, e há que dar ao público algo que o mova, algo credível. Com esta pureza, despertou reações intensas entre os seus admiradores mas também nos seus detratores.
A Antena 2 assinala em vários programas o centenário da mítica cantora lírica.
Em Império dos Sentidos, durante a semana que antecede o dia do centenário, de 27 de novembro a 1 de dezembro (2ª a 6ª feira), a partir das 9h00, Paulo Alves Guerra, traz registos de Maria Callas na Juilliard School em masterclasses, dirigindo-se aos alunos.
[A partir de 2h23m]
Em Mezza-Voce, no dia da efeméride, André Cunha Leal assinala o centenário do nascimento de Maria Callas, uma das mais emblemáticas sopranos do século XX. Em antena é recordada a sua inesquecível visita a Lisboa no ano de 1958, com a lendária atuação em La Traviata de Giuseppe Verdi, e enfatiza-se um dos papéis mais marcantes da sua carreira: Floria Tosca na ópera Tosca de Giacomo Puccini. Esta representação, gravada em Agosto de 1953 no Teatro alla Scala em Milão, conta com um elenco de prestígio, incluindo Giuseppe Di Stefano no papel de Mario Cavaradossi, Tito Gobbi como Scarpia, sob a batuta do maestro Victor de Sabata.
Callas, conhecida pela sua interpretação intensa e emocional, trouxe uma nova profundidade ao papel de Tosca, cimentando o seu legado como uma voz incomparável no universo da ópera. Esta gravação histórica não só reflete a excepcional capacidade vocal de Callas, mas também a sua habilidade em captar a essência dramática da personagem, deixando uma marca indelével na história da ópera.
Em Café Plaza, também no sábado, dia 2, Germano Campos, dedica parte da sua emissão a esta efeméride, com uma breve biografia, declarações da cantora e excerto da sua passagem por Lisboa, além de várias árias interpretadas por ela.
No programa Caleidoscópio, desde o início de Outubro, João Gobern tem apresentado a série, Maria Callas – Voz de Diva.
Nesta série programada para celebrar este centenário, os registos de Maria Callas estão em natural evidência, não descurando o percurso pessoal e o artístico, o paralelismo entre a sua figura pública e a sua vida, as rivalidades e amizades, as candidatas a “herdeiras”, os compositores que lhe marcaram o percurso e, claro, o seu estatuto de diva. E sublinhando também a sua passagem por Portugal e pelo Teatro de São Carlos.
Caleidoscópio | Domingo 22h00 | Quarta 13h00 | Sábado 5h00
SABER MAISA propósito desta sua viagem a terras lusas, e da inesquecível interpretação de La Traviata no Teatro de São Carlos, recordamos a edição pela RTP /Antena 2, da caixa de duplo CD, com a gravação pela Emissora Nacional desta récita em Lisboa, em Março de 1958, em que Maria Callas era a protagonista principal, coadjuvada pelos cantores Alfredo Kraus e Mario Sereni, com o Coro do Teatro Nacional de São Carlos e a Orquestra Sinfónica Portuguesa (pertencente à Emissora Nacional), dirigida por Franco Ghione.
Esta gravação compreende também o momento único de se poder escutar a mensagem de Maria Callas, dirigindo algumas palavras ao público português.
Esta edição de colecionador Verdi: La Traviata : Lisboa 1958 foi publicada em Março 2004, numa caixa de dois CD’s com livreto de 90 p., com texto de apresentação de João Pereira Bastos (diretor da Antena 2), o argumento e o libretto bilíngue de La Traviata (italiano e português) e inúmeras fotografias da estadia em Lisboa e récita de Maria Callas.
Foi uma publicação sem fins comerciais que suscitou um grande interesse no público, mas sobretudo nos conhecedores, já que era a única com a fonte sonora original e oficial, de matriz profissional (pela RDP) que não se compara com os fonogramas utilizados noutras edições (nomeadamente pela Gramophone em 1987).
Também nos Arquivos da RTP, estão disponíveis, entre outros,
- o episódio do lendário programa O Gosto pela Música, de João de Freitas Branco, sobre
- o episódio do célebre programa O Canto e os seus Intérpretes, de Maria Helena de Freitas dedicado à soprano grega, Maria Callas
- a Reportagem pela televisão portuguesa, desde a chegada ao Aeroporto da Portela à receção da cantora lírica no Teatro Nacional de São Carlos: Maria Callas em Lisboa
Nascida María Kekilía Sofía Kalogerópulu (em grego Μαρία Καικιλία Σοφία Άννα Καλογεροπούλου), Maria Callas era filha de imigrantes gregos e, devido a dificuldades económicas, teve que regressar à Grécia com a sua mãe em 1937. Estudou canto no Conservatório de Atenas, com a soprano Elvira de Hidalgo.
Existem diferentes versões sobre a sua estreia. Alguns situam-na em 1937, como Santuzza numa montagem estudantil da Cavalleria Rusticana, de Mascagni; outros, a Tosca (Puccini) de 1941, na Ópera de Atenas. De qualquer forma, o seu primeiro papel em Itália teve lugar em 1947, na Arena de Verona, com a ópera La Gioconda, de Ponchielli, sob a direção de Tullio Serafin, que se tornaria seu mentor.
Callas começou a despontar no cenário lírico em 1948, com uma interpretação bastante notável da protagonista da ópera Norma, de Bellini, em Florença. Todavia, a sua carreira só viria a projetar-se em escala mundial no ano seguinte, quando a cantora surpreendeu crítica e público ao alternar, na mesma semana, récitas de I Puritani, de Bellini, e Die Walküre, de Wagner. Ela preparara o papel de Elvira para a primeira ópera em apenas dois dias, a convite de Serafin, para substituir quem realmente faria aquele papel.
A partir dos anos 1950, Callas começou a apresentar-se regularmente nas mais importantes casas de espetáculo dedicadas à ópera, como La Scala, Covent Garden e Metropolitan. São os seus anos áureos, e a par da sua fama como cantora internacional, cresce a fama de diva, muitas vezes considerada temperamental pelo seu perfeccionismo. Famosa foi a sua rivalidade com Renata Tebaldi e os conflitos públicos, através de declarações para a imprensa, que ganhavam primeiras páginas, assim como seus triunfos operísticos.
O mediatismo de que era alvo, contribuiu para reacender o vedetismo do género ópera e dos seus intérpretes. Alguns críticos inclusive afirmam que até nas editoras havia divisão, para acirrar as disputas entre Callas e Tebaldi, e para influenciar as comparações entre gravações feitas por Tebaldi ao lado do tenor Del Monaco, e Callas ao lado de Di Stefano.
A sua voz começou a apresentar sinais de declínio no final dessa década, e a cantora diminuiu consideravelmente as suas participações em óperas completas, limitando a sua carreira a recitais, noites de gala e breves sessões de gravação em estúdio.
No entanto, em 1964, encorajada pelo cineasta italiano Franco Zefirelli, volta aos palcos numa das suas maiores criações, Tosca de Puccini, no Convent Garden, tendo como parceiro o amigo de longa data Tito Gobbi. A 9 de fevereiro de 1964, efetua-se uma transmissão televisiva da gravação do 2º ato dessa ópera para o programa A Golden Hour from the Royal Opera House, com Callas como Tosca, Gobbi como Scarpia e Renato Cioni como Mario. O primeiro e o terceiro ato não foram efetuados para o programa.
Além de Tosca, entre 1964 e 1965, interpretou Norma de Vincenzo Bellini em Paris. Cantou nas suas últimas récitas dessa ópera contra ordens médicas, e a sua exaustão é evidente nas gravações feitas por alguém no público. Callas desmaiou no camarim antes que pudesse cantar a última cena da performance do dia 29 de maio de 1965; a sua roupa foi trocada antes que acordasse e insistisse em continuar na récita.
A sua última apresentação numa ópera completa foi como Tosca, a 5 de Julho de 1965, em Londres. O abandono deveu-se em grande parte ao desequilíbrio emocional da cantora, que ao conhecer o magnata grego Aristóteles Onassis, dedicou-se integralmente a este, afirmando que a sua vida de verdade começava ali. A agressividade e o relacionamento abusivo do magnata com o soprano eram notáveis, como foi relatado por amigos. Uma famosa frase dita por Onassis a Callas foi: “Você tem apenas um apito na garganta, e ele já não funciona.” Em 1968, o empresário casou-se com Jacqueline Kennedy.
Em 1969, atua como Medea, no filme homónimo de Pier Paolo Pasolini. Além disso, após ter a sua técnica avaliada pela sua antiga professora Elvira de Hidalgo, grava a última sessão em estúdio pelo selo EMI.
Em 1971 e 1972, deu master classes durante dois anos na Juilliard School.
Em 1972 e 1973, gravou com o tenor Giuseppe di Stefano, um álbum de duetos para a editora Philips. O seu lançamento, contudo, não foi autorizado; mas encontra-se disponível atualmente na Divina Records. Além disso, também com di Stefano, dirigiu uma produção da ópera de Giuseppe Verdi I vespri siciliani, em Turim, em 1973.
Também em 1973, voltou aos palcos para realizar uma série de concertos pela Europa, Estados Unidos e Extremo Oriente, junto de di Stefano. Cantou em público pela última vez a 11 de novembro de 1974 em Sapporo, no Japão.
Em 1975, Onassis teve sérios problemas de saúde e morre. Callas começou então um período de isolamento do mundo, passou a viver na Avenue Georges Mandel, em Paris, na companhia da governanta, Bruna, e do motorista, Ferruccio.
Um possível regresso é ensaiada e estimulada pelo cineasta Franco Zefirelli. Uma gravação da La Traviata, com o tenor em ascensão Luciano Pavarotti é ponderada, mas o projeto logo é abandonado por ela. Uma gravação de agosto de 1977, na qual ela ensaia o verso “Deh! non m’abbandonar” da ária “Madre, pietosa vergine” (La forza del destino, de Giuseppe Verdi), mostra um grande desenvolvimento vocal em relação à última década. Essa é a última gravação conhecida do grande soprano.
Callas faleceu em 16 de setembro de 1977, aos 53 anos, no seu apartamento em Paris devido a um ataque cardíaco. As suas cinzas foram lançadas ao Mar Egeu.