Libreto Édouard Blau, Paul Milliet e Georges Hartmann
Estreia Teatro Hofoper de Viena em 16 de fevereiro de 1892
AntecedentesA ópera Werther é baseada no romance epistolar de Goethe, Os Sofrimentos do Jovem Werther (Die Leiden des jungen Werthers). Goethe escreveu o romance durante um ataque repentino de inspiração, quando tinha apenas 24 anos. Apesar de reconhecido pelos seus poemas líricos, contos e peças teatrais, foi com Os Sofrimentos do Jovem Werther que atingiu a fama internacional. Com o romance, Goethe solidificou a sua posição como líder do movimento romântico alemão conhecido como Tempestade e Ímpeto (Sturm und Drang).
O romance de Goethe é, em grande parte, autobiográfico, baseado nas suas experiências com um amor não correspondido. Goethe chegou a Wetzlar aos 22 anos como advogado. Mas o jovem passava mais tempo a filosofar do que propriamente a trabalhar.
Poucas semanas depois, conhecia Charlotte Buff, apelidada de "Lotte", numa festa duma pequena aldeia vizinha. Ela parecia-se muito com a Charlotte retratada no livro e na ópera: uma jovem tranquila e alegre que, depois da morte trágica da sua mãe, passou a cuidar dos seus nove irmãos mais jovens. Ele não sabia que Charlotte já estava noiva de Johann Christian Kestner, um jovem bem sucedido e muito admirado. Apesar do choque e decepção, Goethe tornou-se amigo de Lotte e Kestner, tendo passado um verão idílico, mesmo que doloroso, com o casal. Até que, no final do verão, Lotte disse a Goethe que ele não deveria esperar nada mais que a amizade dela. O jovem escritor deixou a povoação em Setembro, mas continuou a corresponder-se com o casal. Charlotte e Kestner casaram-se em Abril do ano seguinte.
O suicídio de Werther foi inspirado no suicídio verídico de Karl Wilhem Jerusalem, um conhecido de ambos: Goethe e Kestner. Como o Werther do livro, Jerusalem era um pintor taciturno que gostava de fazer longas caminhadas sozinho. Era Jerusalem quem exibia o vestiário "ao estilo britânico" de Werther – casaca azul, colete amarelo de couro, calções e botas compridas. Circulavam rumores que ele amava uma mulher casada que o tinha rejeitado. Jerusalem enviou uma nota à Kestner, informando-o que faria uma longa jornada e necessitava das suas pistolas emprestadas. Sem sequer imaginar que Jerusalem planejava cometer suicídio, Kestner emprestou as pistolas. Jerusalem foi encontrado morto na manhã seguinte pelo seu criado e a notícia da sua morte causou um forte impacto em Goethe; o escritor identificava-se intensamente com o amor não correspondido e o consequente desespero de Jerusalem.
Goethe resolve então apresentar esta história como um romance epistolar. Em Os Sofrimentos do Jovem Werther, este corresponde-se e desabafa com o seu amigo Wilheim. Estas cartas descrevem, em sequência, os dezoito meses de amor enlouquecido e não correspondido de Werther por Lotte. Quando Werther se torna tão insensato a ponto de não poder corresponder-se mais, Goethe assume o papel de editor e descreve os sentimentos íntimos do personagem enquanto este desce ao fundo do poço em direcção ao suicídio.
O livro foi um sucesso. Por toda a Alemanha, jovens começaram a imitar o jeito de vestir de Werther. Os românticos escreveram poemas inspirados na história; pinturas e litografias de Charlotte chorando na tumba de Werther tornaram-se comuns. Wetzlar começou a aparecer em guias turísticos, que mostravam o túmulo de Jerusalem e outros pontos de referência mencionados no livro. Napoleão declarou ter lido Werther sete vezes.
Apesar de nunca ter sido facto comprovado, a lenda romântica conta que Os Sofrimentos do Jovem Werther suscitou uma onda de suicídios por toda a Europa. O romance foi tido como perigoso pela censura em Leipzig e na Dinamarca, onde foi banido. Apesar de não se considerar responsável pelo suposto surto de suicídios, Goethe acrescentou um poema a edições posteriores onde o fantasma de Werther admoestava o leitor a não seguir seu exemplo.
Werther manteve-se de leitura obrigatória mesmo para as gerações posteriores de românticos e Massenet foi um dos muitos que viveu intensamente aquele livro de Goethe, chegando a afirmar que "escrever Werther foi uma das experiências mais fascinantes de minha carreira". Ele declarou: "Em Werther, coloquei toda a minha alma". O compositor conseguia com música, capturar o sentimento da obra-prima da literatura alemã numa ópera francesa – um feito extraordinário.
Contudo, a ópera possui algumas diferenças relevantes em relação ao romance. Por exemplo: no romance não está claro se Charlotte também ama a Werther. Na versão de Massenet, Charlotte sofre tanto quanto Werther. No romance, Werther morre sozinho, sem a possibilidade de rever sua amada. A ópera de Massenet contém um acto completo onde os dois amantes declaram o seu amor recíproco antes que Werther morra. Massenet também expandiu o papel de Sophie, a radiante irmã de Charlotte.
Resumo
I Acto
Alemanha campestre em 1780, do lado de fora da casa de um Magistrado viúvo. Está uma bela manhã de Julho e o Magistrado está e ensinar uma canção de Natal aos seus filhos. O natal ainda está longe, mas ele quer que as crianças aprendam bem a canção. Para encorajá-las, ele diz que sua irmã mais velha, Charlotte, está a ouvi-los. Johann e Schmidt, amigos do Magistrado, vieram convidá-lo para se juntar a eles na taberna. Ficam a ouvir as crianças.
Sophie, uma das filhas do Magistrado, junta-se a eles, e conta-lhes que Charlotte está a vestir-se para o baile daquela noite. Eles discutem sobre os amigos e parentes que vão à festa – incluindo Werther, um jovem poeta, brilhante, porém melancólico, que será o acompanhante de Charlotte. Eles também falam sobre o noivo de Charlotte, Albert, que está numa viajem de negócios, há já seis meses.
Johann e Schmidt dirigem-se à taberna e o Magistrado fica com os seus filhos. Chega Werther, maravilhado com a beleza da natureza em seu redor. Fica a observar as crianças a cantarem. Charlotte desce para dar o jantar às crianças e quando o Magistrado se apercebe da chegada de Werther e apresenta-o a Charlotte. Diz-lhe que é ela quem toma conta dos jovens irmãos e irmãs desde que sua mãe morreu. Entretanto, Brühlmann e sua noiva Kätchen, que estão perdidamente apaixonados e abstraídos de tudo que os rodeia, juntam-se a Werther e Charlotte.
Charlotte deixa as crianças ao cuidado de Sophie. Werther fica profundamente tocado com o carinho que Charlotte demonstra pelos irmãos. Werther, Charlotte, Brühlmann e Kätchen saem para o baile e o Magistrado vai encontrar-se com seus amigos no bar; Sophie fica com as crianças.
Passam as horas… A noite cai. Albert, noivo de Charlotte, aparece. Ele regressou e queria surpreender Charlotte, mas fica desapontado ao encontrar somente Sophie em casa. Albert conversa com Sophie sobre seu casamento e depois sai para não estragar a surpresa. Antes de partir, reflecte sobre o amor de Charlotte.
Charlotte e Werther regressam do baile, caminhando juntos sob a luz da lua. Nesta altura, Werther já está completamente apaixonado por Charlotte. Ele diz-lhe que ela é a mulher mais maravilhosa à face da terra; a sua devoção para com as crianças é uma prova disso. Ela responde tristemente, falando sobre a bondade da sua mãe e sobre seu desejo de honrar a memória dela. Werther confessa a Charlotte que está apaixonado e ela, assustada, despede-se e tenta esquivar-se. Dentro de casa, o Magistrado anuncia que Albert regressou. Werther exige saber quem é Albert e Charlotte explica-lhe que ele é o homem com quem ela prometeu à sua mãe casar-se. Durante o tempo em que esteve com Werther ela esqueceu-se dos seus votos, mas agora tinha que ir. Enquanto entra, Werther afirma que a promessa de Charlotte é a sua maldição.
II Acto
Setembro daquele mesmo ano, na praça da cidade. É o quinquagésimo aniversário de casamento ("bodas de ouro") do pastor. Vieram convidados de todas as partes para a celebração. Johann e Schmidt estão sentados em frente à pousada a beberem vinho e a observarem os transeuntes. Chegam tabém Charlotte e Albert. Eles já estão casados há três meses.
Depois chega Werther que observa o casal à distância. A ideia de que ele poderia ter conquistado o coração de Charlotte enche-o de desespero; o seu espírito inteiro, coração e alma estão estilhaçados. Esmorecido, senta-se num banco, enterrando o seu rosto entre as mãos.
Entretanto, Johann e Schmidt tentam confortar Brühlmann, abandonado por Kätchen depois de sete anos de noivado. Todos, com excepção de Werther, entram para assistirem a celebração das bodas de ouro.
Albert sai e coloca sua mão sobre o ombro de Werther. Diz-lhe gentilmente que conhece os seus sentimentos por Charlotte e que os compreende. Ele não guarda rancor a Werther. Esforçando-se para conter as suas emoções, Werther assegura a Albert que ele tem os dois como amigos. A conversa é interrompida por Sophie, que pede a primeira dança a Werther. Ela repreende-o por estar cabisbaixo num dia como aquele, quando todos estão tão alegres. Werther pergunta-se a si mesmo se algum dia ele vai conseguir ser feliz. Quando Sophie sai, Albert incentiva Werther a buscar o seu próprio contentamento, denotando que Sophie poderá fazê-lo feliz.
A sós, Werther sente-se repugnado por ter mentido a Albert acerca dos seus sentimentos. Continua a sofrer terrivelmente e é inútil pretender o contrário. Decide partir mas a sua decisão é demolida quando, de relance, vê Charlotte à distância.
Werther dá-se conta de que tudo o que deseja é vê-la outra vez. Então, aproxima-se e fala com ela sobre o dia em que se conheceram. Charlotte recorda-o que ela é uma mulher casada; Werther deve deixar a cidade. Mas Werther fica revoltado só de pensar que ela possa ter pena dele. Charlotte implora-lhe que não regresse antes da véspera de Natal.
Desamparado, Werther decide partir para sempre. Contemplando o suicídio, ele pensa que talvez Deus o receba no céu como o filho que regressou mais cedo do que se esperava. Quando está para sair, Sophie aparece à porta do baile e pede para que ele entre. Werther avisa-a que está de partida e que não voltará nunca mais. Arrasada, Sophie dá a notícia a Charlotte e Albert enquanto a procissão das bodas de ouro cruza a praça.
III Acto
Véspera de Natal na casa de Albert e Charlotte. Albert voltou a ter que viajar por motivos de trabalho. Sozinha no seu quarto, Charlotte olha para as cartas que recebeu de Werther. Ela sabe que deve destruí-las, mas, em vez disso, leu-as e releu-as várias vezes. As cartas têm um tom fatalista que a assusta. Sophie entra e tenta animar a sua irmã, mas Charlotte começa a chorar e confessa que o seu coração está partido. Sophie tenta persuadir Charlotte a descer e a juntar-se ao resto da família para celebrar e depois sai, deixando a irmã novamente a sós.
Charlotte pede a Deus que lhe dê forças. Eis que surge Werther. Desesperadamente, Charlotte tenta controlar as suas emoções na sua presença. Eles falam zelosamente sobre o passado e recordam os belos dias que compartiram juntos. Charlotte lembra-lhe um poema de Ossian que Werther tinha começado a traduzir. Ele começa recitar o poema e ambos ficam emocionados com a arrebatadora descrição de desespero. Charlotte fica tão abalada que começa a chorar. Werther, intrigado com o desconforto de Charlotte, pergunta se ela o ama e Charlotte foge à questão. Intuindo a verdade, ele insiste e tenta beijá-la. Desnorteada, Charlotte deixa-se cair nos seus braços por um momento antes de se afastar. Depois diz-lhe nunca mais deve voltar a vê-la e foge para outro quarto, onde se tranca. Ele implora que ela saia do quarto, mas ela não responde. Werther decide dar fim à sua própria vida e sai.
Albert regressa, preocupado e taciturno por Werther ter sido visto nas redondezas de sua casa. Ele encontra Charlotte conturbada e nervosa e exige saber se Werther a visitou. Mas antes que ela possa responder, um criado traz um bilhete de Werther, informando-o que vai partir numa jornada e pedindo-lhe emprestado as suas pistolas. Dando-se conta da intenção de Werther, Albert ordena friamente a Charlotte que dê ao criado as pistolas. Ela obedece aturdida. Albert sai irritado e Charlotte apressa-se a ir ter com Werther antes que seja tarde demais.
IV Acto
O apartamento de Werther. Charlotte entra e encontra Werther caído no chão, fatalmente ferido. Werther pede-lhe que o perdoe. Ela quer ir à procura de ajuda, mas ele diz que prefere passar seus últimos momentos a sós com ela. Charlotte finalmente confessa que o ama; os dois ficam absortos. As vozes das crianças são escutadas à distância. Cantam a canção de Natal que aprenderam há tempos atrás. Werther pede a Charlotte que o enterre no final de uma estrada deserta, onde ela poderá visitar seu túmulo. Ele morre nos braços de Charlotte enquanto as crianças continuam a sua canção de Natal.