Na madrugada de 25 de Abril de 1974, o Capitão Salgueiro Maia comandou a coluna militar que, partindo da Escola Prática de Cavalaria, em Santarém, ocupou o Terreiro do Paço e cercou o Quartel do Carmo, em Lisboa, culminando na rendição de Marcello Caetano e na queda do Estado Novo.
O homem certo na hora e lugar certos, como se escreveu, e que se tornou símbolo de uma revolução sui generis, sem derramamentos de sangue nem violências. “O carácter pacífico dos acontecimentos revolucionários teve expressão simbólica nas flores colocadas por soldados e populares nos canos das espingardas que se mantiveram silenciosas durante todo o golpe militar. A imagem da «revolução dos cravos» correu mundo. Dois jornalistas espanhóis diriam que Portugal passou de «um lugar de escravos a uma pátria de cravos»”1.
No âmbito do Projeto de História Oral do Centro de Documentação 25 de Abril da Universidade de Coimbra, entre 1990 e 2009, foi desenvolvido o trabalho O 25 de Abril contado pelos protagonistas, em que a investigadora Maria Manuela Cruzeiro conduziu uma entrevista a Salgueiro Maia, realizada em Santarém, a 1 de março de 1991.
Entrevista a Salgueiro Maia
por Manuela Cruzeiro
23 e 24 abril | 18h00
A Antena 2, em vésperas dos 50 anos do 25 de Abril, emite nos dias 23 e 24, em duas partes, duas horas desta entrevista histórica com o capitão de Abril que, com audácia e ponderação, comandou a coluna militar da Escola Prática de Cavalaria, na “Operação Fim Regime”, ocupando a baixa de Lisboa e o cerco do quartel da GNR no Largo do Carmo, que levou à rendição de Marcello Caetano.
Salgueiro Maia foi o rosto símbolo de uma madrugada que se esperava, do dia inicial inteiro e limpo / onde emergimos da noite e do silêncio, um dia ímpar na história de Portugal.
23 abril | 1ª parte
Salgueiro Maia fala do seu papel no próprio dia da revolução, capitaneando as forças armadas no encontro com a força militar do brigadeiro Junqueira dos Reis (afeto ao regime ditatorial) na Ribeira das Naus, e no cerco ao Quartel do Carmo (onde se refugiava o chefe do governo Marcello Caetano de quem aceitou a rendição).
Refere-se também aos antecedentes do 25 de abril, nomeadamente a partir da chamada Revolta das Caldas.
24 abril | 2ª parte
Salgueiro Maia fala do seu papel logo a seguir ao 25 de abril, ainda durante o período revolucionário e após o 25 de novembro.
Alguns momentos da entrevista:
Na manhã do dia 24 decide-se agir. O povo português é que decide politicamente, os soldados são “garantes” da necessidade de liberdade e democracia.
Na sua visão pessoal, a revolta iria possibilitar o diálogo com os movimentos de libertação e poderia instaurar a liberdade e a democracia em Portugal.
A adesão popular foi muito forte, e é esta a massa popular que faz avançar os acontecimentos.
Finalmente, as pessoas começam a perder o medo…
A origem do Cravo como símbolo da Revolução
Fernando José Salgueiro Maia nasceu em Castelo de Vide a 1 de julho de 1944. Em 1966 ingressou na Escola Prática de Cavalaria (Santarém). Faz a guerra colonial em Moçambique (1967-69), e na Guiné (1971-73). Foi um dos elementos mais ativos do MFA, tendo participado em inúmeras reuniões conspirativas.
No dia 25 de Abril de 1974, comandou a mais poderosa força dos militares revoltosos, a coluna militar que saiu da EPC (Escola Prática de Cavalaria) de Santarém e marchou sobre Lisboa, ocupando o Terreiro do Paço, e fazendo frente às forças do Regime que aí se concentraram. Horas mais tarde, comanda o cerco ao Quartel do Carmo, que termina com a rendição de Marcello Caetano. Após a entrega do chefe do governo destituído, no Quartel da Pontinha, às ordens dos revoltosos, monta a guarda na Cova da Moura aos dirigentes saídos da Revolução: a Junta de Salvação Nacional.
No dia seguinte, regressa ao seu lugar na Escola Prática de Santarém.
Recusou, ao longo dos anos, ser membro do Conselho da Revolução, adido militar numa embaixada à sua escolha, governador civil de Santarém e pertencer à casa Militar da Presidência da República. Foi promovido a major em 1981 e, posteriormente, a Tenente-coronel.
A 24 de setembro de 1983, recebe do Estado Português a Grã-Cruz da Ordem da Liberdade, e no Dia da Liberdade de 2016, foi agraciado a título póstumo com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique.
Não lhe foi concedido pelo governo, após 1989, o pedido de atribuição de uma pensão “por serviços excecionais e relevantes prestados ao país”.
Salgueiro Maia morreu a 4 de abril de 1992, aos 47 anos, vítima de cancro.
1 António Araújo, Diário de Notícias, 20 set. 2019.