Dias da Música na Antena 2
29 Abril | 15h00 – 21h00 | Transmissão direta
Castigos, Culpas e Graças Divinas
AS GRAÇAS DIVINAS E A RECONQUISTA DO PARAÍSO
E1 | 15h00
Orquestra Gulbenkian
Ton Koopman, direção musical
Programa
Joseph Haydn (1732-1809) – Sinfonia nº 49, La Passione
Jean-Philippe Rameau (1683-1764) – Suíte de Les Indes Galantes
Jean-Féry Rebel (1666-1747) foi um dos primeiros compositores franceses a escrever música de dança não inserida em espetáculos teatrais ou operáticos. É o caso de Les Élémens, dedicada a um dos seus mecenas, o príncipe de Carignan. Embora subintitulada «simphonie nouvelle» é, na sua essência, uma suíte com vários andamentos de dança, precedidos por um outro andamento, Le Chaos, que constitui um extraordinário momento musical do Barroco francês: a descrição do caos que precedeu a criação do mundo e dos seus quatro elementos constitutivos, segundo a tradição ocidental: a terra, a água, o fogo e o ar.
O subtítulo da Sinfonia nº 49 de Jospeh Haydn (1732-1809), La Passione, foi atribuído a posteriori, sendo citado pela primeira vez numa fonte datada de 1790. A obra articula-se, como era normal, em quatro andamentos, contudo é a última sinfonia de Haydn que apresenta uma estrutura que comporta um andamento lento logo de início. Trata-se de uma das obras orquestrais mais sombrias de Haydn, típica do período enquadrado na estética Sturm und Drang (Comoção e Ímpeto).
Depois de Jean-Baptiste Lully (1632-1687), foram poucos os compositores que conseguiram manter viva a tradição da Tragédie Lyrique. Seria apenas na geração seguinte que a ópera francesa viveria a sua fase mais gloriosa, graças sobretudo a Jean-Philippe Rameau (1683-1764). Hippolyte et Aricie foi a sua primeira ópera, seguindo-se Les Indes Galantes, Castor et Póllux, Les Fêtes d’Hébé e muitas outras, as quais abrangeram os vários géneros. As primeiras óperas de Rameau foram acusadas de ser demasiado complexas e antinaturais e de subverter a herança de Lully, mas na realidade estas são as principais herdeiras dessa tradição – o próprio compositor o admitiu no prefácio de Les Indes Galantes.
Gulbenkian Música
E2 |17h00 | Transmissão direta
Sinfonia Dante
Grande Auditório
Orquestra Sinfónica Metropolitana
Pedro Amaral, direção musical
Coro Sinfónico Lisboa Cantat
Jorge Carvalho Alves, maestro do coro
Programa
Franz Liszt (1811-1886) – Sinfonia Dante
Como um filme que se baseia numa obra literária, Franz Liszt deixou-se guiar pela fascinante Commedia de Dante Alighieri e compôs em 1855 uma sinfonia magistral. O imaginário suntuoso do poeta toscano, repleto de alegorias morais e projeções místicas, espelha a dimensão grotesca da sua narrativa num diálogo despudorado com a partitura. No longo andamento inicial é retratada uma dor imensa, um turbilhão de sensações inspirado na ideia de Inferno que preenche a primeira parte do livro. Ouve-se um rodopio frenético de ventos possessos, gritos e exclamações de horror, angústias cavernosas que contrastam com o marasmo da pretensa evocação do amor funesto de Francesca e Paolo. Nalgumas passagens apodera-se literalmente do texto, como nas primeiras melodias, que correspondem ao fraseio rítmico de «Per me si va nella città dolente» («Entra-se por mim na cidade da tristeza»), palavras que se leem quando o autor e protagonista da viagem se depara com as portas do inferno. E mais à frente, «Lasciate ogni speranza, voi ch’entrate!» («Abandonai toda esperança, vós que entrastes»). Já o Purgatório explana-se em sonoridades bastante mais cristalinas, na ponderosa ascensão de Dante até ao brilho das estrelas. Compassadamente, atinge-se um estado de ânimo que nos remete para a última parte do poema, o Paraíso, muito embora o compositor não o assuma com igual evidência. Sem interrupção, florescem na distância as vozes de um coro feminino entoando o cântico da Virgem Maria, «A minh’alma engrandece o Senhor».
Rui Campos Leitão
E3 | 19h00 | Transmissão direta
A Reconquista do Paraíso
Sónia Grané, soprano
Leonor Amaral, soprano
Anna Harvey, meio-soprano
James Gilchrist, tenor
Diogo Mendes, barítono
Coro Gulbenkian
Orquestra XXI
Dinis Sousa, direção musical
Programa
Robert Schumann (1810-1856) – Das Paradies und die Peri, op. 50
«A minha maior obra e, espero, a minha melhor», foi como Schumann se referiu a Das Paradies und die Peri após a sua estreia. Tratando-se da sua primeira obra para um grande efetivo, com coro, orquestra e solistas, foi provavelmente também aquela que obteve maior sucesso durante a vida do compositor. Após a calorosa receção na estreia, várias apresentações foram imediatamente agendadas e a obra rapidamente se afirmou como uma referência. O libreto, baseado no poema Lalla-Rookh, de Thomas Moore, conta a história de uma criatura bela, Peri, que é expulsa do paraíso e que, para lá poder voltar, tem de encontrar na Terra aquilo que é mais querido dos deuses. As três partes desta Oratória narram as três tentativas de Peri de encontrar o presente que os deuses exigem, entre campos de batalha e pragas mortais, até finalmente conseguir que as portas do paraíso se abram para a receber. O texto, uma extensa fantasia orientalista que captou o interesse de Schumann (e de Wagner, que confessou ter querido escrever uma ópera com o mesmo texto) acabou por cair em desuso, mas o estilo extremamente descritivo deste mundo exótico e longínquo foi precisamente o que estimulou a imaginação de Schumann que, nunca cedendo a exageros, criou uma partitura extremamente variada e profundamente expressiva. Quase dois séculos depois, esta obra-prima permanece uma das pérolas do romantismo, absolutamente surpreendente na beleza das melodias e texturas, entre ópera e ciclo de canções, certamente a mais rica partitura para orquestra que Schumann nos deixou.
Dinis Sousa
E4 | 15h00
Cantatas de Bach
Pequeno Auditório
Avres Serva
Daniel Elgersma, contratenor
Nuno Oliveira, direção musical, órgão (solo e baixo contínuo)
Maria João Sousa, soprano
António Lourenço Menezes, contratenor
João Pedro Afonso, tenor
André Henriques, baixo
Kinga Ujszászi, primeiro violino (concertino)
Programa
Johann Sebastian Bach (1685-1750)
– Cantata Geist und Seele wird verwirret, BWV 35
Primeira Parte
I. Sinfonia
Segunda Parte
V. Sinfonia
– Cantata Gott soll allein mein Herze haben, BWV 169
I. Sinfonia
São raras as cantatas de Bach para voz solista, quase todas para alto. Estas terão sido escritas em 1726, para um cantor de características peculiares. Incorporam andamentos de concertos instrumentais, mais tarde reescritos para órgão, quiçá por falta de um instrumento solista como o oboé, ou por força da inauguração do órgão Silbermann recentemente instalado na SophienKirche em Dresden.
A Cantata 35 fala-nos da cura de um homem surdo e na alegria que se segue. Bach cria novos desafios de composição, por oposição a conceitos musicais conservadores, usados nos ciclos de cantatas anteriores compostos em Leipzig. A Cantata 169 aborda o tema do amor a Deus e ao próximo, onde ainda se pergunta: «O que é o amor de Deus? É o resto do espírito, o delicioso prazer da mente, o paraíso da alma. Ele fecha-nos o inferno, e abre-nos o céu.»
O órgão apresenta-se como solista, sendo que o baixo contínuo é executado por outro instrumento de tecla. É provável que Bach possa ter desempenhado ambas as funções com um instrumento de três teclados e pedaleira que não sobreviveu até aos dias de hoje, pelo que optámos por um segundo órgão, sendo várias as opções de registação para ambos. O Affekt resulta ainda do temperamento e afinação usados, criando-se a música apropriada ao movimento e significado das palavras. Assim, para sintonia entre a afinação da orquestra (Kammerton) e a do órgão solista (Chorton), este tocará uma versão transposta das duas obras num temperamento descrito pelo próprio Bach.
Nuno Oliveira
E5 | 17h00
In Paradisum
Dora Rodrigues, soprano
André Baleiro, barítono
Coro Ricercare
Joaquim Ribeiro, direção musical
Melleo Harmonia:
António Figueiredo, violino
Programa
Gabriel Fauré (1845-1924) – Requiem, op. 48
«Mon Requiem a été composé pour rien…pour plaisir, si j’ose dire!!» Estas palavras de Gabriel Fauré, expressas numa correspondência datada de 1910, endereçada ao musicólogo Maurice Emmanuel, embora reveladoras de uma certa humildade, não fazem justiça à profundidade e beleza que o Requiem, op. 48, o seu «Petite Requiem», encerra. Trata-se de uma obra estreada em 1888, na igreja La Madeleine, onde o compositor ocupava, à época, o cargo de Mestre de Capela, tendo sofrido uma revisão em 1893 e uma última em 1900, data da sua publicação e apresentação na Exposição de Paris de julho desse ano. A versão inicial, composta para pequeno conjunto instrumental e coro, consistia apenas em cinco andamentos – Introito e Kyrie, Sanctus, Pie Jesus, Agnus Dei e In Paradisum – tendo Fauré acrescentado o Ofertório em 1889 e o Libera me no ano seguinte. A orquestração sofreu igualmente uma expansão, contando a versão de 1893 com um instrumentário mais rico, embora ainda em formato de câmara. A beleza manteve-se insondável, perdurando até hoje o magnetismo da obra.
André Cunha Leal
E6 | 19h00
Pequeno Auditório
António Rosado, piano
Programa
Franz Liszt (1811-1886)
A música de Franz Liszt é um dos expoentes máximos do virtuosismo musical do século XIX, e a sua obra para piano é talvez o melhor cartão de visita para essa faceta da sua escrita. No entanto, tal como a sua vida, repleta de viagens e de histórias que poderiam encher anais das melhores peripécias da história da música, as suas composições para piano primam também por uma grande diversidade e assimilação de influências da vida cultural do seu tempo, não se delimitando às amarras exclusivas do virtuosismo. São sobejamente conhecidas as deslumbrantes obras inspiradas pelas suas viagens e locais por onde passou como é o exemplo premente de Itália e Suíça, onde se inspirou para a composição de Années de Pèlerinage que reúnem um conjunto de 3 cadernos, de onde se extrai Les cloches de Genève, pertencente ao 1º volume («La Suisse») composto entre 1848 e 1854. Não menos importantes são as obras em que se inspirou na literatura de autores seus contemporâneos. É o caso das Harmonies du Soir (1851) e das Consolations (1844-1850), presumivelmente inspiradas em textos de C. Baudelaire e C. A. Sainte-Beuve, respectivamente. A primeira faz parte dos 12 Études d’exécution transcendante. Apesar de ser escrita na estrutura tradicional da forma sonata, esta obra é marcada por uma grande elasticidade tonal e momentos de puro virtuosismo contrabalançados por passagens onde Liszt parece antecipar as influências do impressionismo na música que décadas mais tarde revolucionou a música para piano. As Consolations terão sido possivelmente inspiradas numa colecção de poesia homónima escrita por Sainte-Beuve em 1830, sob a temática do valor da amizade como monumento consolador à falta de fé religiosa. A «Cantique d’Amour» é o último movimento do 3º caderno de Harmonie Poétiques et Religieuses (1848-1853), um excelente «cocktail» das diferentes facetas da escrita de Liszt.
Tiago Manuel da Hora
E7 | 16h00
Sala Luís de Freitas Branco
Vocal Ensemble
Vasco Negreiros, direção musical
Daniela Matos, Rute Flores, Jorge García, Rui Aleixo, Nacho Rodríguez, Javier Cuevas
Orlando di Lasso (1532-1594) – Lágrimas de São Pedro
I – Il magnanimo Pietro / II – Ma gli archi
Com um motete da Paixão em língua latina, Vidi homo, fecha Orlando di Lasso a colecção de madrigais espirituais intitulada Lagrime di S. Pietro, sobre poemas de Luigi Tansillo. O compositor morreu três semanas antes de que tenha sido ouvida por primeira vez.
Guardadas as devidas proporções, Luigi Tansillo terá sentido na pele angústia semelhante à do personagem bíblico em causa, à altura em que publicou as Lagrime di S. Pietro (1560), pois encontrava-se sob acusação dos inquisidores e do próprio Papa devido às suas Stanze di coltura sopra gli orti delle donne, de 1534, altamente obscenas e licenciosas, que entraram no Indice dos livros proibidos. Foi precisamente com a obra que Orlando di Lasso pôs em música que Luigi Tansillo, o qual Torquato Tasso considerava um dos melhores poetas italianos do Cinquecento, obteve finalmente perdão, apesar de nem aqui abdicar totalmente de referências ao amor carnal, a sua grande especialidade, comparando a capacidade de um bom amante de ler os desejos mais recôndidos nos olhos da amada, com a forma como Pedro lê o que lhe dizem os de Cristo (na stanza 56, quarto entre os madrigais de Lasso).
Por seu turno, para Orlando di Lasso, neste momento de despedida da vida terrena e estando a passar por uma fase muito infeliz, fazia sentido escrever uma obra de grande fervor penitencial, manifestação de extrema tristeza.
Não terá sido por acaso que os primeiros grandes teóricos da Retórica Musical, como Johann Burmeister, viam em Orlando di Lasso o exemplo máximo da poética dos sons. Nesta sua última obra, a manifestação expressiva do texto, distribuída simbolicamente pelo raro número de sete vozes, em 21 peças (3×7), encontra o seu voo mais arrojado, desde as planuras do céu, até ao mais profundo abismo do inferno.
Vasco Negreiros
E8 | 18h00
Sala Luís de Freitas Branco
La Reverdie:
Claudia Caffagni voz, alaúde
Programa
Cave canem Deus videt: Anónimo (século XIII) – Bonum est confidere1
Ira: Doron David Sherwin – Carnem irae
Inveja: Anónimo (século XIII) – Sicut de ligno parvulus4
Avareza: Anónimo (século XIII) – Curritur ad vocem2
Gula: Anónimo (século XIII) – Alte clamat Epicurus3
Preguiça: Anónimo (século XIII) – Ad cor tuum revertere1
Luxúria: Anónimo (século XIII) – Veritas Equitas4
Soberba: Guillaume de Machaut – Fons totius superbie / O livoris feritas / Fera pessima5
Inferno: Anónimo (século XIII) – Flete perhorrete1
Morte de um pecador: Anónimo (século XIII) – O labilis sortis4
Último Julgamento: Tommaso da Celano (c.1185-1265) – Dies Irae (gregorian hymn)
Paraíso: Anónimo (século XIII) – Virgines egregiae4
Roberto Padoin – Sitivit anima mea
Fontes
1. Firenze, Biblioteca Medicea Laurenziana, Pluteus, 29,I (século XIII)
2. Wolfenbüttel Herzogl. August. Bibliothek, Helmst. 1206 (olim 1099) (século XIII)
3. München, Bayerischen Staatbibliothek, Codex Latinum Monacensis 4660 (século XIII)
4. Parigi, Bibliothèque Nationale de France, MS fr. 146 (c.1318)
5. Parigi, Bibliothèque Nationale de France,fonds français 1586 (MachC) (c.1350)
Uma viagem pela música dos séculos XIII e XIV que parte do centro do quadro Os Sete Pecados Mortais, de Hieronymus Bosch, atravessando as secções que descrevem os vários pecados, até chegar ao círculo do Paraíso. As representações alegóricas de Bosch estão profundamente enraizadas no imaginário medieval. Aliás, as categorias dos sete pecados, muitas vezes opostos às virtudes, tiveram um grande sucesso como tema iconográfico desde o séc. XII. Esta combinação entre Bosch e a música de estilo moral/satírica vem principalmente do repertório de Carmina Burana e do Romance de Fauvel, e encontra o seu significado precisamente no paralelismo entre as imagens com as quais Bosch retrata pecados humanos e os textos musicais que descrevem os mesmos pecados, por vezes recorrendo a um realismo pitoresco, e noutras utilizando símbolos abstratos. A acusação de decadência moral e da admoestação à redenção é expressa através de representações alegóricas e de fantasia. Um caminho expressivo-estético que relaciona a linguagem das pinturas de Bosch com a linguagem do mundo goliardo e a poesia moralista da corte francesa no século XIV.
LaReverdie
E9 | 16h00
O Jardim das Delícias
Daniel Cunha e Paulo Oliveira, pianos
Johann Sebastian Bach (1685-1750)/György Kurtág (1926-) – Quatro Corais. Transcrição para quatro mãos/dois pianos:
Das alte Jahr vergangen ist BWV 614
Charles-Valentin Alkan (1813-1888)/José Vianna da Motta (1868-1948) – Benedictus op. 54 para dois pianos (original escrito para piano com pedaleira)
William Bolcom (1938-) – Garden of Eden – rags para dois pianos
I. Old Adam (Two Step)
As transcrições celestiais de corais de J. S. Bach para piano a quatro mãos/dois pianos feitas por György Kurtág foram elaboradas para uso do casal Kurtág (György e Marta) e são, muitas vezes, tocadas pelos próprios em concertos, alternando com a coleção de obras Játékok, da autoria do compositor húngaro.
A obra Benedictus, op. 54, de Alkan foi originalmente escrita para piano com pedaleira. Sendo raro de encontrar hoje em dia, este instrumento gozou de alguma popularidade no séc. XIX. Benedictus, composição monumental, revela uma luta espiritual intensa, sendo a música, por vezes, tenebrosa e quase demoníaca – em Ré menor – e noutras, celestial, em Ré maior. É uma obra que sugere a justaposição entre a dúvida e a fé, mas que tem um final glorioso, com um triunfante coral em Ré maior. Vianna da Motta foi um defensor e divulgador da música de Alkan durante uma época em que este era muito pouco popular. Numa tentativa de tornar as obras do compositor belga para piano com pedaleira mais acessíveis, transcreveu várias obras, para dois pianos, piano a quatro mãos e a solo, como é o caso deste Benedictus, op. 54 para dois pianos.
Em Garden of Eden, William Bolcom conta a história bíblica da Queda do Homem em ragtime, o que é surpreendente, não sendo este o género musical que se esperaria ouvir associado a esta história. O compositor usa várias formas desta dança para ilustrar esta história, com destaque para o complexo e virtuosístico Serpent’s Kiss, cheio de contrastes e de efeitos surpreendentes, que recordam a tradição do ragtime, como as batidas com o pé e na madeira.
Daniel Cunha
E10 | 18h00
Sala Almada Negreiros
Fernando Lapa, compositor
Sara Barros Leitão, adaptação/conceção, atriz
João Castro, ator
Toy Ensemble:
Jed Barahal, violoncelo
Programa
Gil Vicente (c.1465-c.1536) – Auto da Barca da Glória
O Auto da Barca da Glória, último deste tríptico, o único que foi escrito em Castelhano e que, por isso, se distingue sonoramente dos anteriores. Atribui-se a sua primeira apresentação a 1519, onde Leonor de Áustria terá sido espectadora. Por essa razão, «as dignidades altas e os Anjos, mas também o Diabo e a Morte, falam a língua da nova rainha», como escreve Ernestina Carrilho.
Glória é um desfile de figuras em que se apresentam almas depois da morte, sendo que a Morte, desta vez, ganha um corpo vivo. «Cada uma das altas dignidades entra em cena pela sua mão, ao ritmo de um movimento de ir e vir, uma imagem teatralizada da Morte como inexorável ceifeira de vidas», que inspira o ritmo do espectáculo. Organizado de forma estilizada, faz suceder personagens da área do poder, numa sucessão hierárquica. A sugestão é de movimentos direcionais ascendentes, enfatizando a progressão em crescendo. Será curioso explorar as possibilidades de um texto em castelhano traduzido em música e na barca que mais referências tinha em si encerrada elementos cénicos, ser forçada a um jogo que privilegia a economia de recursos físicos.
Glória terá sido apresentada por ocasião da semana santa, e apesar de não parecer ser um auto muito adequado à realidade litúrgica, todos localizam a sua representação nos dias de redenção. Acontecimento que, curiosamente, se irá repetir na apresentação deste espectáculo numa tarde de domingo, não muito longe da Páscoa, sob o mote: Castigos, Pecados e Graças Divinas.
Sara Barros Leitão
Alguns concertos são gravados pela Antena 2
Concertos no Recinto
| Palco Nascente |
Jugalbandish:
Vasco Pimentel, piano
Shiva é um dos deuses supremos do hinduísmo, conhecido também como «o destruidor e regenerador» da energia vital. Significa o «benéfico», aquele que faz o bem. De acordo com a doutrina hindu, o deus Shiva pertence à Trindade chamada de Trimûrti, formada por: Brahma, o deus da criação; Vishnu, o deus da preservação; e Shiva, como o deus da «destruição e regeneração».
Neste concerto, o agrupamento Jugalbandish propõe-nos um concerto onde o Ocidente, representado pelo piano e pelo contrabaixo, se encontra com o Oriente, representado pelas tablas. Duas tradições musicais distintas que se fundem num concerto único que procura explorar através da música as duas facetas do deus Shiva, visto por uns com terror pelo seu poder destrutivo, e por outros com esperança, dado que este é simultaneamente o deus da regeneração.
| Palco Poente |
Tiago Marques, direção musical
Jazz Cantat
Sometimes I feel
Swing low, sweet chariot
Oh! I know I have another buildin’
Sinner, you know
Bye and bye
I want to go to heaven
Little David
Wade in the water
Old ark’s a-movering
My Lord, what a morning
Rise up shepherd
Ev’ry time I feel the Spirit
Steal away
Plenty good room
Oriundos das comunidades de escravos nos Estados Unidos, os espirituais eram cantados como um meio de expressão dos sentimentos de sofrimento, dor e angústia duma vida de escravidão, mas também de esperança num futuro melhor e de alegria e júbilo pelas recompensas do além.
18h15 | Saint Dominic’s Gospel Choir
A arte, a alegria e a religiosidade do Gospel
Conferências
16h00 | Dante, o seu «Poema Sacro» e a Paixão de Francesca
Conferencista: António Mega Ferreira
Nos seus 14.233 versos, distribuídos ao longo de cem cantos, a Divina Comédia de Dante Alighieri (1265-1321) descreve uma viagem do Poeta pelos territórios do Além, em busca do Amor divino que tudo explica e redime. Porém, não é um poema inteiramente metafísico: escrito ao longo de mais de quinze anos de exílio de Dante, durante os quais se manteve permanentemente afastado da sua Florença natal, a Divina Comédia é também um reflexo dos violentos combates políticos do tempo, nos quais o Poeta se envolveu. E é ainda um repositório das suas dúvidas, hesitações e angústias, pelo qual perpassa a contradição entre a obediência cega aos ditames de Deus e a sua pulsão emocional propriamente humana. Um dos maiores exemplos dessa ambivalência é o célebre Canto V do Inferno, do qual aqui se dará a versão integral, em tradução do conferencista.
António Mega Ferreira
Veja ainda a programação de sábado dos Dias da Música, na Antena 2:
Excertos musicais a partir de várias salas
Comentários, entrevistas, apontamentos de reportagem
Fotos Jorge Carmona / Antena 2 RTP