Ferreira de Castro – 100 Anos Vida Literária
Nos 100 anos de Vida Literária de Ferreira de Castro, a Biblioteca Nacional e outras instituições culturais em diversos pontos do país, têm vindo a comemorar esta data marcante de um dos maiores e mais traduzidos escritores portugueses.
As suas duas primeiras obras publicadas, obras juvenis – Criminoso por Ambição (“Sensacional romance expurgado de phantasia”), impresso em fascículos, e a peça em dois actos Alma Lusitana – foram editadas há precisamente um século, quando ainda vivia no Brasil. São o início de uma prestigiada vida literária que colhe em Emigrantes e em A Selva duas das suas obras maiores, e o consagraram como figura referencial da moderna literatura mundial.
J. M. Ferreira de Castro, Criminoso por ambição.
Belem-Pará: typ. F. Lopes, 1916.
Exposição
8 Junho a 29 Julho
Biblioteca Nacional
Sala de Referência
Entrada Livre
José Maria Ferreira de Castro nasceu a 24 de Maio de 1898, na aldeia de Salgueiros, freguesia de Ossela (Oliveira de Azeméis), filho de José Eustáquio Ferreira de Castro e de Maria Rosa Soares de Castro, caseiros. Da meninice ficarão as marcas de um íntimo contacto com a verdejante natureza envolvente. Originário duma família camponesa humilde, emigra para o Brasil, sozinho, apenas com doze anos. Enviado para um seringal da Amazónia, onde trabalha até aos dezasseis – vivência fundamental para a sua formação –, vai para Belém do Pará, onde, a par de trabalhos temporários e mal remunerados se auto-educa na Biblioteca Pública da cidade. Aí edita, em 1916, os dois primeiros livros, um dos quais, Criminoso por Ambição, fora escrito ainda em plena floresta amazónica, em 1912-1913. Ingressa no jornalismo, com sucesso, até ao regresso a Portugal, em 1919. Na década seguinte trabalha arduamente como free lancer na imprensa, publicando cerca de uma dezena de títulos que virá a eliminar da sua tábua bibliográfica.
É a partir de 1928, com Emigrantes, que Castro se encontrará como autor, ao relatar a epopeia dum arquétipo, duma «personagem-multidão» compelida à expatriação por um modelo de organização social de desigualdade e, não menos importante, por uma estrutura cultural que privilegia a posse – neste caso fundiária – como forma de afirmação individual. Emigrantes, com as suas bem marcadas tensões sociais e ideológicas bem vincadas, lança assim os fundamentos da novelística proletária e de extracção social que, uma década mais tarde, será designada por neo-realismo. Simultaneamente, inscreve no romance português novecentista uma corrente marcadamente libertária (ou anarquista) sem paralelo nos autores seus iguais, nomes cimeiros da narrativa contemporânea, atomizada pelo casticismo do Aquilino Ribeiro de Andam Faunos pelos Bosques, o psicologismo do José Régio de Jogo da Cabra Cega, o cosmopolitismo mundano do Joaquim Paço d’Arcos de Ana Paula, o realismo socialista do Alves Redol de Gaibéus ou o realismo integral católico do Francisco Costa de Cárcere Invisível. Na sequência de Emigrantes, Castro publica A Selva (1930), que não só confirma o posicionamento ideológico do autor como a via romanesca iniciada no livro anterior. Obra densa em que o escritor apôs a sua verdade interior, é reconhecidamente um dos grandes romances portugueses do século XX, tendo internacionalizado o seu autor como jamais sucedera a qualquer romancista português, em sua vida ou mesmo post mortem: em 1973, a Unesco divulga que A Selva estava entre os dez romances mais lidos em todo o mundo, mercê das traduções nos principais idiomas da cultura ocidental.As narrativas seguintes mostram os recursos de um escritor que se renova a cada título e sedimentam o lugar de Ferreira de Castro como autor referencial do seu tempo, nos aspectos literário, cultural e sociológico: Eternidade (1933), Terra Fria (1934), A Tempestade (1940), A Lã e a Neve (1947), A Curva da Estrada (1950), A Missão (1954) e O Instinto Supremo (1968). Por razões extraliterárias, que se prendem com a Censura instituída pelo Estado Novo, dedicou-se também à literatura de viagens, com Pequenos Mundos e Velhas Civilizações (1937-38) e A Volta ao Mundo (1940-44), bem como a uma longa digressão estética, da Pré-História à contemporaneidade, com As Maravilhas Artísticas do Mundo (1959-63). Deixou inéditos Os Fragmentos (1974) – volume que além de evocações memorialísticas inclui o romance O Intervalo – e a peça Sim, Uma Dúvida Basta (1994). A difusão da sua obra além-fronteiras teve o correspondente reconhecimento com a candidatura ao Prémio Nobel de Literatura, em 1951 e 1968, sempre proposto por entidades estrangeiras. Ao Prémio Ricardo Malheiros da Academia das Ciências (1934) sucederam-se o da Academia das Belas Artes de Paris (1963), o «Águia de Ouro» do Festival do Livro de Nice (1970) e o da União Latina (1971), conjuntamente com Jorge Amado e Eugenio Montale.Faleceu em 29 de Junho de 1974, e está enterrado na Serra de Sintra, na vila à qual doou o seu espólio documental, a partir do qual se instituiu o Museu Ferreira de Castro. Também Ossela o homenageia, com a sua Casa-Museu.
Ricardo António Alves
Centro de Estudos Ferreira de Castro
Guarda
Exposição
Ferreira de Castro: Vida e Obra
Patente de 7 a 29 Junho
9 Junho 18h00
Documentário
Escritores a Norte – Vidas com obra em casas de escrita: Ferreira de Castro
15 Junho 18h00
Conferência
“Dos Emigrantes, através d’A Selva, até A Lã e a Neve, de Ferreira de Castro”,
por António dos Santos Pereira
Para ouvir excertos de Terra Fria, de Ferreira de Castro, e a entrevista ao responsável da editora Cavalo de Ferro que tem estado a reeditar a obra do escritor, clicar aqui.