Libreto: Da Ponte segundo Beaumarchais
Estreia: Burg em Viena – 16 de Julho de 1782
PersonagensFígaro
Susanna
Dom Bártolo
Marcellina
Cherubino
Conde d’Almaviva
Dom Basílio
Condessa d’Almaviva
António
Dom Curzio
Barbarina
Duas Raparigas
AntecedentesA ópera "As Bodas de Fígaro" nasceu da primeira colaboração entre Mozart e Da Ponte, que foi levada pela primeira vez a cena no Burgtheater de Viena no dia 1 de Maio de 1786 – sendo recebida com grande frieza.
A verdadeira consagração aconteceria apenas quando da sua estreia em Praga em Janeiro do ano seguinte.
1.º ActoA ópera começa numa saleta do palácio dos Almaviva onde Fígaro, o ardiloso barbeiro sevilhano ao serviço do Conde, está a tirar as medidas do quarto enquanto Susana, a criada da Condessa, experimenta um chapéu que confeccionou propositadamente para o casamento dos dois. Quando Fígaro começa a louvar as vantagens daqueles aposentos por se encontrarem a dois passos dos aposentos dos patrões, Susana fica horrorizada. Essa proximidade pode ter grandes vantagens quando precisarem deles a meio da noite, mas representa também um perigo: se eles podem acorrer rapidamente ao chamamento, também o Conde ali pode chegar em dois tempos na ausência de Fígaro. A Condessa toca a campainha e Susana sai. Fígaro fica sozinho a remoer a sua raiva jurando vingar-se. Aparece Marcellina com o Doutor Bártolo, seu antigo patrão, que planeiam juntos uma forma de forçar o barbeiro a casar com Marcellina, como prometera em pagamento duma dívida. Marcellina quer o que é seu por direito, e o Doutor Bártolo quer vingar-se de Fígaro pelo papel que ele teve no rapto da sua pupila, Rosina, a actual Condessa. Susana regressa e depara com Marcellina. As duas cumprimentam-se com mal disfarçada antipatia, e Marcellina sai, quase se cruzando com o pagem Cherubino que chega furtivamente. Ele vem procurar consolo junto de Susana depois de ter sido severamente repreendido pelo Conde que o surpreendeu com Barberina, a filha do Jardineiro. Cherubino depois suspira pensando na beleza da Condessa, e invejando a sorte de Susana que está sempre tão próxima dela. Aproveitando um momento de distracção da criada, o pagem rouba um dos laços da Condessa que se recusa a devolver a Susana pagando aquele favor com uma canção que compôs e que se propõe cantar para todas as mulheres do palácio. Assim todos ficarão a conhecer a verdadeira dimensão do seu ardor. Mal Cherubino termina a canção ouvem-se vozes, e o jovem não vê outra saída senão esconder-se atrás duma cadeira. O Conde entra procurando os favores de Susana. Depois ouve-se a voz de Dom Basílio, e o Conde vai esconder-se no lugar onde estava o pajem, dando apenas tempo a Cherubino para saltar para cima da cadeira, onde Susana o cobre com um casaco. Dom Basílio entra e começa a contar intrigas sobre Cherubino e sobre o Conde, acentuando que mais não faz do que repetir aquilo que se diz pelos corredores do palácio. Enfurecido, o Conde deixa o seu esconderijo, e Susana finge um desmaio, do qual rapidamente recupera quando vê os dois homens aproximar-se da cadeira onde está o pagem. O alvo da maledicência passa agora a ser apenas Cherubino, o qual o Conde acha que deve ser despedido. Ainda na véspera encontrara a porta do quarto de Barberina fechada à chave, e lá dentro, debaixo duma mesa, descobrira Cherubino. Juntando o gesto à palavra, o Conde levanta o casaco que cobre Cherubino. Quando está prestes a mandar Dom Basílio chamar o barbeiro, compreende que o pagem deve ter escutado toda a sua conversa com Susana. O pagem responde que tudo fez para nada ouvir. E as recriminações terminam com a chegada de Fígaro que vem agradecer ao Conde ter renunciado ao ancestral, e detestável, direito senhorial. Surpreendido, o Conde pergunta do que é que ele está a falar, e Fígaro responde anunciando o seu casamento com Susana, marcado para esse mesmo dia, e pedindo ao Conde para lhe dar a honra de ser ele próprio a celebrar a cerimónia. O Conde não tem outro remédio senão aceitar, mas aproveita para sugerir a Cherubino que imite o barbeiro e a criada casando com Barberina. Susana recorda ao Conde que Cherubino acabou de ser despedido, e, depois da insistência de todos, o Conde decide perdoar… nomeando-o oficial do seu regimento, para junto do qual deve partir de imediato. Fígaro despede-se de forma marcial, desejando as maiores felicidades a Cherubino, que sai a contra gosto.
2.º ActoO 2º acto começa nos aposentos da Condessa a qual, depois de Susana lhe narrar os últimos avanços do Conde, lamenta a aparente perda do afecto do marido. A Susana regressa para terminar de contar a sua história, assegurando que o Conde considera as jovens como ela meras presas, simples fonte de divertimento, mas nada mais do que isso. A Condessa comenta ser uma atitude típica dos maridos daquele tempo: infiéis mas ciumentos, por vaidade. Figaro chega com um plano para apanhar o Conde em flagrante. Ele avisou-o que, essa noite, a Condessa tem um encontro marcado nos jardins. Susana deverá, por seu lado, marcar um encontro com o Conde nesse mesmo local – só que, em vez de Susana, irá Cherubino mascarado de mulher. A Condessa não sabe se será ajuizado implicar o jovem pajem, que chega nesse preciso instante já com a farda de oficial para cantar a canção como prometera. Depois Susana começa a disfarçá-lo de mulher surpreendendo-se com a sua beleza, ao mesmo tempo que a Condessa, ao observar os papéis do jovem, repara que neles falta a assinatura do Conde. Cherubino tem ainda a fita da Condessa a proteger a ferida que fizera num dos braços, e a Condessa manda Susana buscar um curativo. É então que batem à porta. A Condessa fala com o Conde antes de abrir, dando tempo ao pajem para se esconder no guarda-fatos. Ao mesmo tempo que exprime as suas desconfianças por ter encontrado a porta fechada, o Conde mostra à mulher o bilhete anónimo que recebera. O pajem faz cair qualquer coisa no seu esconderijo – o que chama a atenção do Conde. A Condessa afirma nada ter ouvido, que deve ser a Susana, e aproveita para manifestar o seu desagrado pelo interesse que o marido manifesta pela criada. Mas o Conde não desiste: se é a Susana que saia e se mostre. Susana já regressou e está escondida na alcova, mas compreende que a Condessa lhe manda desobedecer ao Conde, e não aparece. Louco de ciúmes, Almaviva ameaça arrombar a porta. Para evitar escândalos, fecha os aposentos à chave e sai com a condessa para ir buscar um pé-de-cabra. É então que Susana aproveita para fazer Cherubino sair do armário, e, enquanto o pajem foge pela janela, Susana esconde-se no seu lugar. Os Condes regressam, e Almaviva intima o pajem a deixar o esconderijo. A Condessa fica desesperada, o Conde acusa-a de lhe ser infiel, e ela responde dizendo que as aparências são, por vezes enganadoras. O Conde insiste, pede-lhe a chave do armário. Só que, para espanto de todos, em vez de Cherubino aparece… Susana. O Conde ainda vasculha o interior do móvel, mas em vão: não está lá mais ninguém. Então não vê outra saída que não seja pedir perdão à mulher, afirmando que o seu amor continua igual. A Condessa não tem qualquer vontade de lhe perdoar. Apenas Susana a consegue convencer a mostrar-se menos dura. Chega então Fígaro que anuncia que os músicos já estão a postos para a cerimónia. O Conde aproveita para perguntar ao barbeiro se por acaso conhece a identidade do autor da carta anónima. Fígaro começa por negar, mas Susana e a Condessa informam-no de que a intriga foi posta a descoberto. Fígaro aproveita para pedir licença ao Conde para que o seu casamento com Susana se realize de imediato. O Conde esperava a chegada de Marcelina para evitar o enlace, e acaba por encontrar um novo aliado na pessoa do Jardineiro que entra com um vaso de flores partido titubeando que deve ter sido um homem que saltou de uma das varandas. Almaviva tenta obter do Jardineiro um discurso mais coerente enquanto Fígaro afirma, alto e bom som, que o homem está sempre bêbado, quer chova quer faça sol. Depois diz que o homem que saltou da varanda foi ele mesmo, exibindo como prova o facto de ter mesmo um pé torcido, começando de imediato a coxear. Só que o Jardineiro não fica calado: se foi Fígaro quem saltou, devem pertencer a Fígaro os documentos que encontrou ao lado do vaso partido. Acreditando ter apanhado o barbeiro na sua mentira, o Conde pega nos documentos e pede-lhe que lhos descreva. Ajudado por Susana e pela Condessa, Fígaro diz que se trata do brevet de oficial de Cherubino que trazia para ser carimbado. Nesse momento, para grande alívio do Conde, chegam Marcelina e Dom Bártolo que vêm fazer valer os seus direitos sobre Fígaro. Perante a consternação de Fígaro e de Susana, o Conde decreta que essa questão deve ser submetida a julgamento.
3.º ActoO 3º acto passa-se no salão do palácio onde o Conde medita sobre os acontecimentos, dos quais nada entende. A Condessa aparece e fica a alguma distância enquanto Susana vai pedir ao Conde um frasco de sais. Ele entrega-lho dizendo que talvez ela também vá precisar deles quando Fígaro for obrigado pela lei a desposar Marcelina, ao que Susana reage fingindo estar pronta a ceder aos seus desejos. Encantado com a aparente submissão da criada, o Conde convida-a a ir mais tarde ter com ele ao jardim – o que Susana aceita, explicando a sua frieza daquela manhã motivada pela presença de terceiros. Quando sai, Susana esbarra com Fígaro a quem passa discretamente a informação de que tudo está a correr segundo os planos, e que o seu casamento está salvo. Só que o Conde escuta a conversa dos dois e volta a explodir de cólera jurando vingar-se de Fígaro impedindo-o de casar com Susana. Fígaro, Marcelina e Dom Bártolo entram com o notário, Dom Curzio, que acha que o barbeiro ou quita a dívida que tem com Marcelina ou então casa com ela. Fígaro protesta dizendo que é de famílias nobres e que, assim sendo, não pode casar sem o consentimento dos pais. Acrescenta que foi raptado em criança, e que há longos anos tenta em vão localizá-los.
A únicas pistas que possui são a roupa que levava vestida, algumas jóias, e uma marca de nascença no braço direito. Mas o barbeiro não tem sequer tempo para mostrar a marca referida, já que Marcelina se apressa a descrevê-la emocionada: ela e Dom Bártolo são os pais que ele procurava. Os três abraçam-se efusivamente e Susana chega a tempo de ver Fígaro e Marcelina nos braços um do outro, reagindo com um violento estalo aplicado naquela que julga a sua rival. Marcelina explica-lhe a situação e Dom Bártolo pede Marcelina em casamento. Fígaro ficou rico e todos respiram felicidade. Entretanto a Condessa encontra-se com Susana à qual exprime os seus receios quanto ao plano de trocarem de identidade essa noite. Diz que o seu casamento está num estado lamentável, e que o Conde a trai e engana constantemente. Quando a Condessa as afasta entra António com o Conde ao qual informa que Cherubino ainda se encontra no palácio. A Condessa regressa e dita a Susana a carta que confirma o encontro com o Conde – carta que prendem com um alfinete que o Conde deverá devolver como resposta. Chega então Barberina com um grupo de aldeões que vêm trazer flores à Condessa – a qual repara numa bela jovem que está com eles, e que não é senão Cherubino disfarçado. Só que o disfarce dura pouco, já que António tira o chapéu à dita jovem substituindo-o por um chapéu de oficial. O Conde fica furioso, mas Barberina sai em defesa do pagem recordando ao seu amo as promessas que lhe fizera de lhe conceder aquilo que ela mais desejasse. Ora o que ela mais deseja é que Cherubino seja seu marido. O acto termina com os Condes sentados nos seus tronos enquanto Marcelina e Susana recebem os véus para as núpcias – altura que a criada aproveita para entregar o bilhete ao Conde que promete a todos grandes festejos ainda essa noite.
4.º ActoO último acto passa-se à noite nos jardins do palácio onde estão dois pequenos abrigos, um à direita outro à esquerda, numa altura em que Barberina anda dum lado para o outro à procura dum objecto qualquer que perdeu. Quando Fígaro e Marcelina lhe perguntam que objecto é esse, ela responde que é um alfinete que o Conde lhe entregou para levar a Susana. Fígaro fica perturbado com esta prova de infidelidade, e decide vingar-se em nome de todos os maridos traídos. Esconde-se então atrás dumas árvores. Chegam Susana e a Condessa – Susana disfarçada de Condessa, e a Condessa disfarçada de Susana. A Condessa (no papel de Susana) ordena a Marcelina e a Susana (no papel de Condessa) que a deixem ficar só, já que está à espera de alguém. Marcelina e Susana… escondem-se. A Condessa, que sabe que Fígaro a espia, julgando que é Susana, exprime em voz alta toda a alegria que sente pelo próximo encontro com o Conde. Cherubino aparece e tenta beijá-la, julgando tratar-se de Susana. Depois aparece o Conde que afasta o jovem rival, começando a fazer a corte àquela que ele julga ser a criada. Entretanto Fígaro, que já compreendeu tudo o que se passa, começa a fazer a corte a Susana fingindo acreditar tratar-se da Condessa. Como resposta… Susana esbofeteia-o. Fígaro ri e diz que já tinha reconhecido a sua voz, que já sabia que era ela desde o primeiro instante. Decidem então prosseguir com a representação para fazer o Conde acreditar que a Condessa o trai com o barbeiro. A trama resulta: o Conde enfurece-se, manda trazer archotes e testemunhas, e faz sair todos os casais de namorados dos seus esconderijos – incluindo a falsa Condessa que lhe implora perdão, o que ele recusa. Até que se ouve a voz da verdadeira Condessa vinda do outro abrigo pedindo perdão para todos. O Conde compreende ter caído na sua própria armadilha, e que é ele e não outros que tem de ser perdoado – o que faz com que a ópera termina no meio da alegria geral.
RDP – Transmissões em "Noite de Ópera" desde 1996
2000 – 28 de Setembro
2002 – 3 de Janeiro
Enredo resumido da autoria de Margarida Lisboa.